Semana da Consciência Negra na EEFFTO: Racismo e o Ensino Superior | EEFFTO - UFMG  


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Semana da Consciência Negra na EEFFTO: Racismo e o Ensino Superior

22/11/2017 | 12:51

Por Jéssica Romero

O acesso à educação superior é uma das pautas fundamentais para debater as consequências do racismo no Brasil. Apesar de representar a maioria da população, as pessoas negras ainda são minorias nas universidades e enfrentam vivências e desafios singulares no ambiente acadêmico e no mercado de trabalho. Na semana que data simbolicamente a “Consciência Negra”, membros da comunidade da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO) da UFMG comentam esse aspecto da desigualdade racial.

De acordo com uma pesquisa divulgada no ano passado e feita pela Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), apenas 9,8% dos estudantes de universidades federais são negros. O estudo fez uma comparação que considerou o ingresso de estudantes negros nas universidades federais entre os anos de 2003 e 2014.  A década analisada mostra que houve um avanço: em 2003 essa estatística era de 5,9% e em 2014 subiu para 9,8%, mas o número ainda revela uma das formas como o racismo opera na manutenção de uma sociedade que transforma direitos em privilégios.

 

Para discutir este tema é necessário refletir sobre a necessidade de políticas públicas que tentem enfrentar o problema. As cotas raciais e sociais na universidade e em concursos públicos, por exemplo, são algumas delas. O docente do Departamento de Educação Física Luciano Pereira fala sobre a educação como chave para as transformações sociais. 

“As políticas afirmativas são fundamentais para que possamos caminhar para uma sociedade mais justa e democrática. Todas são importantes: as voltadas para a população negra, indígena, oriundos de escolas públicas, entre outras. Os dados da sociedade brasileira retratam uma grande distância entre a população negra e a branca. Por exemplo, pesquisa do IBGE aponta que 67% da população desempregada atualmente no Brasil é negra ou parda. Outra pesquisa mostra que 71% das pessoas assassinadas em nosso país são negras. É preciso enfrentar esses números e um dos caminhos é criar oportunidades educacionais”, explicou Luciano. 

Luciano fez seu doutorado na área de Educação pela UFMG - Foto: Assessoria EEFFTO

Para estudantes negros, o caminho percorrido até ingressar numa universidade pública é muito distinto dos estudantes brancos. A herança de quase 400 anos de escravidão gerou uma estrutura social baseada e uma cultura racista, que geram diferentes impactos na vida de crianças e jovens negros. Além da desigualdade social e das dificuldades econômicas, é preciso enfrentar a violência policial, um padrão branco e excludente de beleza, a falta de representatividade midiática e política, dentre outros fatores que não são possíveis de serem mensurados.  Segundo pesquisas da Organização das Nações Unidas (ONU), no Brasil a população negra é a mais atingida pela violência, o desemprego e falta de representatividade.

Danilo da Silva Ramos é formado em História pelo Centro Universitário Geraldo Di Biase (UGB) e atualmente trabalha como servidor público na EEFFTO. Através de seu olhar como historiador e de suas vivências educacionais e no mercado de trabalho, ele fala sobre o cenário de falsa meritocracia que envolve a universidade.

“É como se a chegada até o vestibular fosse uma pista de corrida. Se pessoas brancas precisam se esforçar para correr e chegar até lá, negros precisam se esforçar para correr numa pista com obstáculos em cada volta. Os obstáculos vêm de gerações que mesmo depois da ‘libertação da escravidão’ não tiveram acesso à educação, cultura e o mínimo de equidade ou dignidade no mercado de trabalho. Até a década de 1920 existiam políticas de enbranquecimento da população brasileira, historicamente isso é pouco tempo. As cotas, por exemplo, trazem a necessidade de demarcarmos essa história e de começarmos a reparar isso. É como se fosse um curativo para tentar criar condições para alcançarmos a igualdade, mas para realmente igualarmos as condições entre brancos e pretos é preciso uma transformação social muito maior que só virá com o tempo e muita luta”, afirmou.

Daniloé secretário do Colegiado do PPGIEL na EEFFTO - Foto: Assessoria EEFFTO/ Jéssica Romero

Como parte das estatísticas que representam a resistência da juventude negra no Brasil, a estudante de educação física Roberta Faria fala sobre sua experiência na universidade pública.

“Ser uma mulher negra neste espaço representa muitas coisas e gera um misto de diversos sentimentos. A academia é um ambiente de privilégio social, mas é um espaço que reproduz o racismo o tempo todo. Durante décadas as pesquisas e o fazer científico de pessoas negras foi deslegitimado e sofreu forte apagamento. Eu consegui conquistar esse espaço, mas tenho que auto afirmar minha capacidade para estar aqui todos os dias. A presença do corpo, do intelectual e das pautas negras incomodam. Estou aqui resistindo para elevar meus processos de intelectualidade, aproveitando ao máximo minhas oportunidades, mas ao mesmo tempo tenho que lidar com minhas pares só do lado de fora ou a maioria está aqui em empregos subalternos, como o da limpeza”, relatou a graduanda.

Roberta também é dançarina do grupo Sarandeiros, da EEFFTO - Foto: Arquivo pessoal

Além do racismo, a estudante destaca o machismo que as mulheres também precisam enfrentar diariamente. Para ela, a vivência que o racismo gera na vida das meninas negras desde a infância as coloca em condições de preterimento e baixa auto estima e auto confiança, fazendo surgir diversos conflitos internos que atravessam a vida universitária.

“Lidar com todos esses conflitos internos e externos na universidade e saber dessas questões não é suficiente para romper com elas, é um processo. Ser uma mulher negra universitária é resistir e ocupar esse espaço que até então nos foi negado, mas nós estamos aqui para bater de frente mesmo. É isso”, disse.

 

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