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Conscientização do autismo é comemorada em todo o mundo

06/04/2017 | 18:05

Desafio para a ciência, o autismo é um transtorno de neurodesenvolvimento que não tem cura, tampouco sabe-se, ao certo, as suas causas. Mas, se por um lado, estudos procuram compreender a sua raiz, por outro, muitos aspectos práticos demandam ainda atenção. Um deles foi simbolizado no último domingo, 2 de abril, considerado o  Dia Mundial de Conscientização do Autismo.

Por se manifestar de variadas formas, cujos grau e intensidade divergem de pessoa para pessoa que o porta, o autismo vem perdendo a sua intitulação tradicional. No lugar, cresce a expressão "Transtorno do Espectro do Autismo" (TEA), que se justifica na heterogeneidade de sintomas e casos. Os autistas possuem certa dificuldade em comunicação e interação social, além de comportamentos repetitivos e padronizados.

Para Ana Amélia Cardoso, professora da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO) da UFMG e terapeuta ocupacional, o fato de autistas serem, por características do transtorno, um pouco mais resistentes a contatos sociais, reforça o quanto a inclusão se faz necessária, e não o contrário.

“A pessoa com TEA precisa ser incluída. Como uma das grandes dificuldades do autista é justamente na comunicação social e interação social, privá-lo do contato com outras pessoas pode piorar os sintomas que já são característicos do transtorno, aumentando o isolamento social”, afirma. Ana Amélia é integrante do Laboratório de Integração Sensorial (Lais), da UFMG.

Ana Amélia é terapeuta ocupacional e está envolvida com estudos e trabalhos na área do autismo

“Há as dificuldades de aceitação pela sociedade, o estigma, preconceito, dificuldades para inclusão escolar e no mercado de trabalho. É muito comum também pessoas com TEA apresentarem dificuldades de coordenação motora, dificuldades em atividades de autocuidado (como tomar banho sozinho, amarrar o cadarço do tênis, etc), dificuldades escolares (não só relacionadas ao preconceito, mas dificuldades de aprendizagem), entre outras", completa a professora.

O diagnóstico precoce do autismo é outro ponto bastante reiterado, e o discurso é simples: antecipada a identificação de sinais que o indiquem, maior a chance de eficiência no acompanhamento desenvolvido com o autista, ainda que o transtorno não tenha cura.

“Quanto mais cedo é feito o diagnóstico e iniciada a intervenção, maiores são as chances de evolução da criança, em todos os aspectos. A criança mais nova apresenta maior plasticidade neuronal, então o tratamento costuma ser mais eficaz”, pontua Ana.

Quando a criança é diagnosticada com autismo, isso requer um envolvimento muito próximo dos pais - como com quaisquer outras. Mas no caso do autista, é necessária a busca por ações interdisciplinares de apoio e suporte, como atendimento de terapeuta ocupacional, psicólogo e fonoaudiólogo, além do acompanhamento médico com psiquiatra e/ou neurologista. Antes de tudo, no entanto, os próprios pais precisam compreender o transtorno manifestado em seu filho.

“Os pais, ao receberem o diagnóstico de TEA, precisam viver o luto do filho que eles imaginavam/sonhavam. Na minha experiência, já vi famílias que sofrem, mas ‘correm atrás’, e buscam tratamento, colaboram com o terapeuta. Mas vi também famílias que passam anos e anos sem aceitar realmente as dificuldades da criança, ‘tampando o sol com a peneira’. As crianças das famílias que ‘correm atrás’ geralmente são aquelas que conseguem maior evolução”, ressalta Ana.

Sob a ótica da maternidade

Há quem viva na condição de mãe ou pai de um filho autista, ou até mesmo como um profissional da área da saúde envolvido com o transtorno. No caso da professora da EEFFTO Rosângela Gomes da Mota, terapeuta ocupacional, as situações se cruzaram há oito anos. Rosângela é mãe de Arthur Gomes da Mota, autista, e viveu uma situação bastante peculiar.

“Eu trabalhei durante dez anos na atenção primária da Equipe de Saúde da Família (ESF) em São Paulo. Naquele contexto, fazia parte da equipe de saúde mental e atendia uma demanda bastante ampliada, onde parte dela era de crianças que vinham por meio de queixa escolar. Esse grupo era misto: tanto crianças com dificuldade de aprendizagem, que não tinham nenhum diagnóstico, mas também algumas com autismo”, conta.

“Trabalhava com saúde mental e não via o que estava acontecendo com meu filho. Na época, foi a escola que nos chamou e relatou o comportamento dele, que, por exemplo, não gostava de atividades coletivas, escondia debaixo da mesa. A principal questão foi a linguagem, que parou com dois anos. Levamos até uma pediatra e ela nos disse que poderia ser autismo. Não fomos nós que percebemos, e isso é bem comum”, relata a professora.

Rosângela Mota, acompanhada de seus filhos Artur Gomes e Sofia Gomes

Assim que soube, Rosângela lembra das questões que começaram a permear suas preocupações com o filho, o que é típico do momento da descoberta. Mas muito mais que isso, a também terapeuta ocupacional alerta para a hora que também se faz necessária: buscar ajuda de profissionais capazes de atuar para o desenvolvimento da criança.

“Quando alguém fala ou suspeita que seu filho tem algum problema, a primeira coisa é dizer “não”, pelo pânico, medo do preconceito quando seu filho crescer. Mas esse é um momento certo de aceitar e pedir ajuda”, pontua.

Atenção dos pais não é uma atitude direcionada apenas a crianças autistas – qualquer uma precisa. O fato é que autistas necessitam de um suporte específico de mediação com uma sociedade que, muitas vezes, não está pronta para recebê-lo.

“Todos os filhos demandam atenções especiais. Mas criança autista demanda que a gente a entenda. Porque a comunicação é diferente, o tempo deles é diferente, então precisamos nos dispor um pouco mais para poder entender e, principalmente, mediar a relação dele com o mundo, que é não muito propício para receber essas crianças. Aliás, não é propício para receber ninguém que é diferente”, declara.

Desde quando compreendeu os sinais de autismo no filho, Rosângela se envolveu ainda mais com a questão, sob óticas ainda mais amplas. “Minha percepção aprimorou principalmente em relação aos pais, para eu poder me colocar no lugar deles”, diz. Esse olhar foi base para uma ação desenvolvida pela professora na EEFFTO desde o semestre passado, no Lais. Trata-se de uma roda semanal de conversas com pais de crianças autistas.

“É um grupo de orientação, onde trabalho questões relativas ao direito, à inclusão. O objetivo é empoderar os pais para que eles consigam uma inclusão de fato para os filhos. As principais questões trazidas são em torno da inclusão escolar e da sobrecarga das mães, que geralmente cuidam mais”, comenta.

Respaldo legal

A Lei nº 12.764, de 27 de dezembro de 2012, dispõe dos direitos dos autistas. Em seu artigo terceiro, fica explícito que

"São direitos da pessoa com transtorno do espectro autista: 

I - a vida digna, a integridade física e moral, o livre desenvolvimento da personalidade, a segurança e o lazer; 

II - a proteção contra qualquer forma de abuso e exploração; 

III - o acesso a ações e serviços de saúde, com vistas à atenção integral às suas necessidades de saúde, incluindo: 

a) o diagnóstico precoce, ainda que não definitivo;

b) o atendimento multiprofissional;

c) a nutrição adequada e a terapia nutricional;

d) os medicamentos;

e) informações que auxiliem no diagnóstico e no tratamento;".

Evento na UFMG 

Entre os dias 17 e 19 de abril, a UFMG vai sediar o congresso internacional “Autismo, dança e educação – poéticas da autoralidade”. O evento vai contar com pesquisadores brasileiros e estrangeiros, em discussões sobre "uma abordagem do autismo que considere o corpo como elemento fundamental de intervenção na perspectiva do laço social".

Confira o site do evento

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