Saúde Mental da população negra é tema do Conversatório do mês de novembro | EEFFTO - UFMG  


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Saúde Mental da população negra é tema do Conversatório do mês de novembro

19/11/2018 | 13:10

Por Laryssa Campos e Thiago Peruch

A temática da saúde mental tem recebido grande atenção nos últimos tempos. Porém, dentro dessa questão há um recorte com especificidades importantes: a saúde mental de pretos e pretas. Por isso, o Conversatório da Escola de Educação Física, Fisioterapia e Terapia Ocupacional (EEFFTO), do mês de novembro, recebeu no dia 8, Iara Pires Viana, militante do movimento de Mulheres Negras de Minas Gerais; Kaio Antunes, especialista em pedagogia do ensino, e, Lívia Andrade, discente do curso de história na UFMG e youtuber.

Os convidados contaram para os presentes sobre histórias pessoais nas quais sofreram racismo em diversas situações. A youtuber do canal “Na veia da Nêga” relatou sobre o modo que a sua presença em lugares majoritariamente ocupados por brancos incomoda aos outros. Lívia sentiu a necessidade de criar um blog em 2015, momento no qual houve uma grande explosão de empresas de cosméticos vendendo produtos para cabelos crespos e cacheados. A estudante se incomodou com o fato de grande parte das blogueiras negras falarem apenas sobre e cabelo e decidiu expor situações para além das questões estéticas.

"A falta de representatividade na internet é uma coisa que grita todos os dias. Mas não adianta só a gente reclamar que não tem, se podemos, devemos fazer. Então, o blog é um canal de comunicação, para que outras pessoas como eu se vejam. Eu não me enxergava nos outros e agora tenho vários seguidores que podem se inspirar a fazer outros tantos pretos se entenderem. É muito importante ocuparmos todos os espaços. As plataformas digitais são locais que causam influência. Se podemos causar uma representação positiva é muito importante”, relatou.

"Todos os dias você precisa provar, não pra si, mas para a Universidade que esse também é o nosso lugar"
Foto: Laryssa Campos/Assessoria EEFFTO

O educador físico Kaio Antunes teve durante sua vida uma grande dificuldade para se entender como homem negro. Kaio relatou que pelo fato de ter nascido em um bairro de periferia, entre os seus amigos, ele era considerado branco, já que a negritude é muito forte nesse ambiente. Porém, ao ingressar em uma Universidade e conviver com pessoas brancas percebeu que na verdade era diferente dos que lá estavam, pois era negro.

“É um processo difícil, porque ele dói. Às vezes você não se vê como negro, no ambiente que você está, quando você troca de ambiente você se vê como um negro. Você sente como um negro sente. E isso dói e pesa. E do mesmo jeito que dói, deixa a gente forte”, disse.

Além de Kaio, na sua sala de graduação havia somente mais quatro alunos negros
Foto: Laryssa Campos/Assessoria EEFFTO

O professor ainda destacou a ausência de pessoas negras nas Universidades e em escolas particulares da cidade de Belo Horizonte, nas quais ele foi docente.

Iara Pires Viana, superintendente de educação do Estado de Minas Gerais, explicou que a falta de pessoas negras da Universidade é intrínseco a trajetória da população preta no Brasil. Ressaltou, ainda, que as políticas de cotas são extremamente recentes no Brasil, já que se iniciaram apenas nos anos 2000.

“Primeiro, a Universidade, por ser pública, ela foi de fato construída para ser também excludente e o processo de cotas é muito recente no nosso país. Outra linha que temos que pensar é que: o direito de estar aqui ainda produza uma resistência. A resistência de estar nesse lugar advém dessa histórica do racismo institucional construída no nosso país”, explicou.

"É necessário reavaliar questões históricas"
Foto: Laryssa Campos/Assessoria EEFFTO

A superintendente destacou a animalização sobre os corpos negros e o modo com o qual essa situação ainda atinge a população preta no século XXI.

“Historicamente, corpos negros foram considerados como não humanos. Sempre foram considerados e, inclusive, faziam parte de grandes zoológicos humanos na Bélgica, na França durante muitos anos. Essa categorização de não humanos significa que não tem conhecimento e não são capazes e, por si só, são inferiores. Sendo assim, são pessoas e corpos que serviriam apenas para servir os senhores, os donos do capital. E nesse sentido, até hoje, historicamente, a gente percebe é que por mais que existam leis que pregam uma igualdade, essa igualdade se torna uma falácia. Porque quando ocupamos, há certo desconforto por parte de outras pessoas, que se assustam com as nossas falas, com os postos que ocupamos. É como se nossos corpos não pudessem permanecer ali, já que não éramos ou não somos considerados humanos, de fato”, esclareceu.

A aluna do curso de Terapia Ocupacional, Thais de Souza Novais, aproveitou o espaço do Conversatório para relatar sobre a vivência pessoal dentro da UFMG.

“Eu sou de periferia, nasci e sempre estudei em escola pública onde é normal você estar na sala de aula e encontrar alunos negros. Vim para a Universidade na qual se sabe que a maioria das pessoas é de classe média o de me enxergar como mulher negra na universidade e me entender assim. Foi quando eu entrei na UFMG que me encontrei, pois não via pessoas como eu”, relatou.

Apenas mais duas pessoas na família de Thais passaram pela faculdade
Foto: Thiago Peruch/Assessoria EEFFTO

Todos os ouvintes foram convidados a se atentar melhor as questões da população negra e fazer o exercício do pescoço, o qual consiste em observar sempre a cor das pessoas nos ambientes que frequentam, para assim, compreender melhor a desigualdade racial no Brasil.

Entenda mais sobre o Sistema de Cotas pelo Site do Ministério da Educação (MEC).